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O Fujão E O Desviado


            O nome dela era Princess e o nome dele era Duke. Duas pessoas? Não. Um casal de cachorros da raça Pastor Alemão. Ela era muita bonita, mas ele nem tanto. Mas foram pais dos mais lindos filhotes. De personalidade a diferença era como a diferença de dia e noite.

            Ela era obediente, caseira, amorosa e queria estar sempre em volta da gente. Era boa mãe para sua cria, paciente com os filhotes, muita sabida em relação das necessidades deles, e sabia antemão se um iria morrer e até o punha fora do ninho. Eu colocava de volta, mas logo depois a minha saída ela o afastava novamente dos demais. E, não por ser rejeitado, mas por falta de condições de sobreviver, morria mesmo. Sabia à hora de mamar, a necessidade do calor do corpo dela, o dia de começar desmamar, soltar do ninho e tudo mais. A natureza da cadela era de admirar, e não cansamos de observar com cuidado estes instintos do reino animal.

            Agora, o Duke era outra coisa. De fato ele era em quase tudo o exato oposto da Princess. Um fato principal se destacava. Ele não gostava de canil, nem do pátio da casa. Ele queria a rua, ou como se diz na gíria, era rueiro. Apesar do seu lado esquisito, ele me poupou muitas noites de sono, pois era bom de briga, mas bom mesmo. Em nosso bairro, infelizmente, havia muitos cachorros soltos na rua. Frequentemente de noite dava brigas feias entre estes cães por causa de uma cadela no cio. Tenta dormir com um barulho destes debaixo da janela do seu quarto. Claro, nosso Duke também queria ir para a rua nestas horas. Ele latia muito que tirava ainda mais o sono da gente. Foi por aí que aprendi o valor do nosso macho esquisito. Eu me levantava, abria o portão para ele poder sair. Sem medo e com muita técnica ele pulava no meio da cachorrada e em questão de segundos todos estavam correndo para casa lambendo suas feridas. Chamava ele, que felicíssimo com sua façanha, voltava para casa para dormir novamente, e a gente, feliz também, voltava para dormir.

            Enquanto a gente estava em casa, Duke se contentava, mais ou menos, de ficar em casa. No entanto, era só viajar, deixando uma caseira para cuidar da casa, e ele fugia. Nunca entendi esta mania dele. Em casa ele tinha a melhor ração para comer, abrigo da chuva e do frio, um tapete/cama para deitar, água fresquinha diariamente, carinho de nós e da caseira. Mas apesar destas mordomias todas, ele fugia de casa.

            Determinada vez, fomos obrigados passar vários meses longe de casa, e durante esta temporada nosso filho e sua esposa se tornaram os caseiros. Mas, Duke, num momento de descuido da parte deles, fugiu de casa mais uma vez. Esta vez, no entanto, ninguém teve sucesso de localizá-lo. Passou vários meses, e todos o deram por definitivamente perdido.

            No entanto, um dia apareceu no portão da casa um trapo de cachorro. Todos foram olhar, pensando que era Duke, mas estava irreconhecível. Sujo, cheio de sarna e carrapatos, pêlo caído, magro e cambaleando, não parecia mais como aquele macho gordinho, saudável, forte, e de pêlo lustroso, que meses antes sumiu de casa. Depois de discutir se era ou não ele, resolveram acreditar que era ele, pois parecia que reagia um pouco ao ouvir seu nome chamado.

            Os filhos o levaram dentro do pátio e lhe deram um banho, depois do qual o levaram para o veterinário. Lá ele recebeu um tratamento do bem e do melhor; novo banho com xampu com remédio contra carrapatos e sarna, vacinação contra vermes, vitaminas e nem me lembro que mais. Depois de poucos dias, ele nem aparecia mais como o trapo que chegou diante do portão de casa. Em questão de semanas, com o carinho, boa ração, remédios e vitaminas, ele estava recuperado ao seu estado anterior. Todo mundo estava feliz de ter o amado Duke de volta para seu lugar, e parecia que ele também regalava nas conhecidas mordomias da sua casa.

            No entanto, depois de mais um tempão, uma nova viagem obrigatória nossa se realizou, resultando em uma ausência nossa de casa por alguns meses. Novamente, num momento de descuido Duke fugiu de novo. No início ninguém se preocupou demais, pensando que dentro de um dia ou dois ele voltaria para casa, sentindo falta de todas as coisas boas, da boa ração, do carinho, da água fresquinha e etc. Mas o tempo se estendeu e o fujão não aparecia. Semanas passavam que se tornava em meses. Ah! Você quer o final feliz? Quer novamente a história do filho pródigo? Infelizmente não havia um final feliz. Duke sumiu e nunca mais retornou para casa. Foi triste!

            Enquanto escrevo esta história estou com lágrimas nos meus olhos, pois gostei demais daquele animal esquisito. Ele era útil. Dava boa cria. Protegia nossa propriedade, e respondia ao meu afeto por ele. Mas apesar de ter do bom e do melhor na sua casa, a rua atraente era demais para resistir. Não há dúvida que já deve estar morto. Morreu atropelado? Doente? Maltratado por alguém? O corpo dele foi jogado a beira da rua? A gente não sabe, mas não precisava ser assim. Simplesmente não era necessário ter sofrido tudo que ele, sem dúvida, sofreu! Recentemente perdemos uma cadela que morreu repentinamente. Mas ela recebeu na sua morte um tratamento digno da fiel amiga que foi através de mais de dez anos.

            As lágrimas, acerca das quais falei acima, estão enchendo meus olhos de novo, somente esta vez não é de tristeza pelo falecimento de um animal de estimação. Sei que você está questionando uma história de animais num site religioso, mas segura mais um pouquinho e vai entender bem o enredo.

            Ao considerar o caso de nosso Fujão, Deus fez me lembrar de várias pessoas ao longo dos anos de nosso ministério que de forma quase igual agiam em relação ao seu pastor e a igreja que frequentavam. Elas tinham um pastor que fez o seu melhor para zelar por elas. Ele orava, jejuava, estudava, a fim de dar o melhor alimento espiritual possível. O fato de outras centenas de pessoas sobreviverem com o mesmo alimento testemunha a sua boa qualidade. Ele e seus auxiliares procuravam da melhor forma possível manter a casa de Deus como ambiente de paz, de tenro cuidado, ponto de apoio espiritual para todos. Isto providenciava o frequente derramamento daquela água espiritual, o Espírito Santo, do qual todos podiam beber liberalmente. Sim, nesta casa espiritual elas tinham o amor, o carinho, a alimentação, a água fresquinha e renovadora, o abrigo, companheirismo, amizade, e uma quase infinita lista de vantagens e bênçãos.

            No entanto, aquela rua, que se chama o mundo, era mais atraente. Parecia que tinha lá fora melhores divertimentos, mais excitação, entre outras atrações. E, para lá foram, deixando para trás um pastor, irmãos e amigos muito preocupados. Quantas vezes tivemos o gozo de receber estes filhos pródigos de volta, mas como no caso do Fujão, Duke, elas precisavam uma atenção muito especial, que não faltou. Deus também não faltou na parte Dele, perdoando, recebendo de volta, batizando novamente com o Espírito Santo, até curando enfermidades resultado da vida que viveu no mundo. No entanto presenciamos estas mesmas pessoas fugir novamente, não podendo resistir à atração do mundo.

            Infelizmente, e não poucas vezes, fui encarregado de ficar ao lado do caixão de um falecido. Um que faleceu longe de Deus, longe da salvação e longe dos amigos e familiares de verdade. Os anos têm passado, mas ainda me lembro com afeto meu Fujão, e meus olhos ficam umedecidos com as lembranças dele. Mas, é com uma emoção ainda maior, uma dor profunda que me lembro daqueles que morreram longe de Deus. E, como no caso do meu Fujão, não era necessário morrer assim.

            Finalizo esta história com meus olhos cheios de lágrimas, pois existem alguns que nunca mais verei. Eles escolheram outro caminho. Algumas mães, santas de Deus, não verão mais seus filhos que escolheram a rua em vez da casa de Deus. Tempo e espaço não me permitem falar mais da tragédia de almas desaparecidas, dos Fujões, que têm muitos nomes, que eu poderia citar, que não farão parte da glória do Reino de nosso Deus, pois a rua de prazeres era mais chamativa do que a casa paterna. Para mim, é difícil até encerrar esta história, pois tenho conhecimento de muitas pessoas que hoje já fugiram ou estão prestes para fugir. Oxalá que fosse me dado um púlpito grande, um sistema de som para alcançar o mundo inteiro para poder advertir a todos da ira vindoura, da perda que eles hão de sofrer. Fico agonizando, pois sei bem demais o que há de ser o final da história deles. O que é que eu e outros podemos fazer depois de providenciar tudo para uma boa convivência na presença de Deus e dar bons conselhos? Orar, e esperar que não fujam, ou que voltem logo para a casa do Pai que tanto os ama. Por favor, Deus, ouça a minha oração!

Philip D. Walmer